Pais e filhos (e irmãos) correm juntos, dando um ‘olé’ na paralisia cerebral

Quando tem corrida no dia seguinte, Gabriel quase não dorme à noite de tanta ansiedade. Mas o cansaço nunca aparece no sorriso largo que ele abre toda vez que toma a pista em seu triciclo, empurrado pelo pai, o engenheiro Rodrigo Rocha. O rapaz, de 15 anos, nasceu com paralisia cerebral e encontrou na corrida um modo de experimentar adrenalina, socializar, melhorar o equilíbrio e… sorrir mais.

— A corrida mudou a nossa vida — conta o pai. — Sempre fui paizão: eu o levava a blocos de carnaval, nos divertíamos juntos. Mas a corrida nos levou a uma situação de mais parceria, confiança. A amizade e o vínculo entre pai e filho aumentaram muito.

Superação

Rodrigo e Biel — como o menino é conhecido nas redes sociais — correm em parceria há quatro anos. Ganharam juntos 53 medalhas, conquistadas em quatro maratonas, 12 meias maratonas, e quatro São Silvestres. Ao longo de todo esse percurso, a evolução física de Gabriel é visível. Antes do esporte, o menino não conseguia erguer o braço direito — lado do corpo sobre o qual ele tem pior controle, de modo geral. Agora, quem assiste às corridas da dupla observa que, ao cruzar a linha de chegada, o jovem comemora levantando efusivamente os dois braços.

— A corrida exige que ele tenha mais equilíbrio sobre o triciclo, então a coordenação melhorou como um todo. É muito bonito de ver — afirma Rodrigo. — Eu sempre falo para ele “você é maratonista”, “você é corredor”… As crianças da escola querem ver as medalhas dele. Isso tudo faz a autoestima do Biel melhorar muito, ele está mais confiante. Isso o ajuda a não ficar sentado em casa na cadeira de rodas achando que não pode fazer muita coisa.

Rodrigo e Biel correndo juntos

Parceria

Quando começaram a prática, pai e filho corriam no “anonimato”, sem contas no Instagram e no Facebook. Mas, desde que criaram perfis nessas redes sociais, de três anos para cá, eles atingiram a marca de 25 mil seguidores no Instagram, e 16 mil na rede de Mark Zuckerberg.

E é pelas redes sociais que o pai dá dicas a outros familiares de pessoas com paralisia cerebral que também querem começar a correr. O que mais perguntam a Rodrigo é como conseguir um triciclo. Aquele usado por Biel para começar no esporte foi desenhado pelo próprio pai, que recebeu ajuda de um amigo projetista para construí-lo todo em inox. Mas é possível encontrar um modelo pronto à venda no mercado por algo em torno de R$ 1.600. Trata-se de um modelo básico, que deve ser adaptado de acordo com a necessidade de cada usuário. Quem não controla bem o tronco, por exemplo, precisa de um encosto maior.

Hoje, Biel esté em seu segundo triciclo: um que pode ser acoplado a uma bicicleta, para permitir a prática do triatlo (natação, ciclismo e corrida). O rapaz e seu pai ainda não começaram a juntar essas três modalidades, mas Rodrigo acredita que isso acontecerá em breve. Por enquanto, a próxima corrida dos dois está marcada para 18 de março: um percurso de 10 km em Niterói.

André Amorim corre com o filho, Miguel, de 5 anos

O primeiro triciclo de Biel foi doado a outra dupla: André Amorim e seu filho, Miguel, de 5 anos. Este mês, eles completaram um ano de corrida juntos. E começaram tendo Rodrigo e Biel como inspiração.

— Eu queria passar aquela mesma sensação pro meu filho. Queria ver no Miguel o sorriso que eu via no Gabriel — lembra o pai, que reúne medalhas de 17 corridas de rua, entre elas a São Silvestre de semanas atrás. — Todas as medalhas são do Miguel, o que me leva é a vontade dele de participar das corridas.

Amorim não é pai biológico do menino. Ele o conheceu ainda recém-nascido, quando era vizinho da mãe de Miguel, deixada pelo marido após ele saber do problema de saúde do pequeno.

— Eu me apaixonei antes pelo Miguel, e a mãe dele veio de brinde — brinca.

Taís Faria e o irmão, Paulo César, de 32 anos, que tem paralisia cerebral

Outro caso de “amor sobre triciclos” é o de Taís Faria, de 28 anos, e seu irmão Paulo César, de 32. O jovem com paralisia cerebral está se preparando, junto com a irmã, para correr a primeira meia maratona, em 25 de fevereiro.

— Praticamos há um ano e meio, e eu vejo que ele interage muito mais com os outros corredores, já está bem mais solto e comunicativo. Antes não era assim — diz ela, que empurra 50 kg nas pistas: o peso de Paulo César, que é cerca de 30 kg, mais o peso do triciclo.

Com informações do Jornal O Globo.

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